sábado, 2 de junho de 2007

A arte de ser feliz - Maria Lúcia


Cito Guimarães Rosa quando diz que: “a felicidade são alegrias que acontecem em raros momentos de distração”. Sim! Mas, acredite que estes momentos nem sempre são tão raros, quando nos distraímos com mais frequência.
Distrair-se para enxergar a felicidade à nossa volta é saber buscar a verdadeira situação que anima a nossa existência. Não se acomodar, mas não sofrer pelo que ainda a gente não conseguiu. Olhar para o que já está à nossa volta com carinho e gratidão. Com certeza teremos muito mais momentos de distração. (Esse é um lembrete, principalmente para mim).
Aprendi nos meus momentos de silêncio, observando meus pais, meus irmãos e até os parentes e amigos que nos visitavam, que para ser feliz, mesmo que seja por momentos, intercalado por aborrecimentos, não precisa muito. Estes gratuitos e feitos de pequenas coisas, que parecem insignificantes em algumas ocasiões, e indispensáveis para grandes alegrias, em outras.
As noites de lua, as orações e até as histórias de fantasmas e bruxas, antes de dormir, o cheiro do café; as primeiras palavras de amor escritas na areia, em segredos que o sopro do vento ajudava a apagar, mas nunca apagado no coração. São tantas as minhas distrações, quando crianças, adolescente, jovem. Agora, adulta me distraio menos, talvez! Mas ainda me pego sorrindo ao entrar em casa e saber que tenho tarefas a cumprir, um almoço de domingo, sem pressa, uma faxina na casa, um banho no cachorro, uma chamada de atenção no meu filho e no meu marido para que me ajudem. Depois de tudo olho em volta e vejo minha família, sinto que também estão contentes. Muitas vezes só nos olhamos e já sabemos o que cada um gostaria de dizer.
Lembro dos momentos felizes com meu filho: seu nascimento tão esperado, todas as suas fases de crescimento, seu primeiro dentinho, sua primeira palavra, sua primeira cantiga de escola, cantada com euforia; depois a escrita: à leitura. Tudo era tão extraordinário para ele e para mim. Muitas vezes o observei brincando com pequenos carrinhos e bonecos, contando histórias e fantasiando seu mundinho. Agradecia a Deus por tê-lo e por ser tão lindo e perfeito, para mim. Chorava de alegria em muitas destas ocasiões. Hoje, depois de dezoito anos, ainda me surpreendo com lágrimas de felicidade e agradecimento pelo dom de ser mãe, pela beleza da vida em família, com várias imperfeições, mas com muito desejo de acertar.
Madre Tereza tem uma oração muito marcante para mim, quando ela busca a felicidade nas adversidades da vida, através do seu amor. “Dai-me alguém para amar”. Ela mostra, neste seu desejo de amar cada vez mais os necessitados, que cada necessidade nossa, por maior que seja, é menor, bem menor do que a misericórdia de Deus. E nós temos tanta fome e sede de Deus, e não compreendemos e acabamos buscando, em outras fontes distantes e obscuras, o que está dentro de cada um de nós pela presença do espírito de Deus. A necessidade de aprender a ser feliz e aprender como um projeto de vida em nossa consciência é cada vez mais urgente, tendo em vista as doenças modernas psicossomáticas, advindas, cientificamente comprovadas pela angústia, medo, insegurança, etc. Adquiridos pela falta de “distração para raros momentos de felicidade”, através de coisas tão simples e pequenas que nos rodeiam a todo instante, mas que “são invisíveis aos olhos e só se enxergam com o coração”, e, talvez muitos dos nossos corações estejam cegos de ambição para conseguir o que ainda não têm materialmente e esquecemo-nos de buscar o que falta espiritualmente.
Quando eu era professora de Filosofia gosto sempre de aprofundar, para os alunos, quando o conteúdo está direcionado, para a necessidade de lembrarmos que temos “corpo” e “alma”, e que cada um ao seu modo, precisa ser alimentado. São vários os meus pontos de vista em relação a esse assunto, baseado, claro, em alguns princípios filosóficos, principalmente nos de Santo Agostinho, Tomás de Aquino, e, do próprio Jesus Cristo. O que eu percebo na turma é um grande vazio, uma falta de argumentos coerentes, distanciamento voluntário, aparentemente sem culpa, das diversas direções que nos levam a viver, e dar forma a motivação de nosso lado espiritual.

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